ÉPOCA – As redes sociais mudaram a forma de fazer política?
Quanto mais a tecnologia evolui, mais a política permanece a mesma. Nos Estados Unidos, no Japão ou no Brasil, a forma que um candidato tem para conseguir um voto é a mesma, há tempos. Começa com o aperto de mãos, olhos nos olhos e a pergunta: “Posso contar com seu voto?”. É difícil fazer isso quando você tem milhões de mãos para apertar. As tecnologias que se firmaram como meios de comunicação de políticos nas últimas décadas ajudaram a tornar mais conhecidos os candidatos e suas propostas. Ao mesmo tempo, afastaram o contato com o eleitor no corpo a corpo. O que vemos, mundialmente, é o retorno dessa política mais próxima, num formato que permite ganho de escala. Você (político) pode interagir pessoalmente com o eleitor pela rede, mesmo com aquele que está distante. Para o candidato, é como poder sentar em cada café e bar do país para ouvir o que falam sobre ele.
ÉPOCA – E pela perspectiva do eleitor?
Sharp – Varia de país a país. Vou dar o exemplo americano. O voto nos Estados Unidos não é obrigatório. Por isso, quem se dispõe a votar normalmente está mais engajado e se interessa mais pelo que o político fará pela comunidade. As redes sociais deram uma nova perspectiva ao eleitor. Principalmente para o que quer ficar por dentro das discussões em sua comunidade, mas não tem tempo de participar de todos os encontros e reuniões. Você pode estar no celular ou no ônibus, e enviar uma pergunta a seu candidato ou a representantes de candidatos, e eventualmente conseguir uma resposta e iniciar uma conversa.
ÉPOCA – As redes sociais poderão substituir os canais tradicionais de comunicação entre político e eleitor?
Sharp – Não substituirão. Agregarão algo. Com a popularização do acesso à internet, os políticos precisam ter todas as ferramentas digitais possíveis para falar com o eleitorado. Muita gente, incluindo jovens, prefere ter contato com os políticos por canais mais antigos, como ler jornais, revistas e o tradicional corpo a corpo. É preciso estar presente em todos eles. Antigamente, a gente tratava as notícias num ciclo de 24 horas. Se o candidato falasse algo que o comprometesse, como chegariam até aquela informação? O candidato tinha tempo para tentar contornar a situação, dar uma entrevista ao vivo, ou mesmo conversar imediatamente com as partes afetadas. Hoje, não. O candidato pode estar em qualquer lugar do país. Se falar alguma coisa comprometedora ao lado de alguém com um smartphone à mão, essa declaração pode se espalhar em questão de minutos. Isso influencia o comportamento dos candidatos.
ÉPOCA – Como o eleitor deve se blindar contra informações falsas?
Sharp – A melhor forma é checar a fonte. Isso é fácil nas redes sociais. Você entra no perfil e checa as credenciais. É um perfil verdadeiro? É o perfil oficial? Pertence a um veículo, jornalista, partido ou político? Em 2011, a congressista americana Gabrielle Giffords foi atingida por um tiro dentro de um supermercado no Arizona. As TVs e os sites de notícia divulgaram que ela morrera. Um repórter de um jornal local, com poucas centenas de seguidores, tuitou que acabara de entrar no hospital da cidade e conversara com os médicos. Ela estava viva. A informação se espalhou rapidamente para o mundo via Twitter. Quinze minutos depois, as redes de TV e rádio que acompanhavam o caso ao vivo corrigiram a informação. A comunidade do Twitter chancelou que a informação trazida por um repórter de um jornal local era a mais confiável.
ÉPOCA – Uma rede social muda voto de alguém?
Sharp – É importante entender o limite do Twitter e de outras redes sociais. Ninguém muda radicalmente seu ponto de vista por causa de um comentário. Os candidatos precisam enxergar o ambiente virtual como uma oportunidade de pegar as opiniões que estão na mesa de jantar, nos bares e restaurantes. O segundo desafio é analisar essas opiniões e transformá-las em aspectos positivos para uma campanha.
ÉPOCA – Que riscos e oportunidades encontra o político nas redes sociais?
Sharp – Qualquer ferramenta de comunicação oferece um balanço entre riscos e oportunidades. No caso de uma tecnologia nova, pode haver problemas por falta de familiaridade na forma como usá-la. A desinformação se espalha mais rapidamente que uma informação correta. É algo natural do ambiente da política. Um candidato dá prioridade para apontar o erro de seu adversário, em vez de mostrar suas virtudes. Mas há muitos benefícios. O primeiro é que o candidato pode escolher exatamente a pergunta que responderá. Isso torna tudo mais “controlável”. As redes sociais também têm a propriedade de autorregulação. Uma informação incorreta pode ser corrigida rapidamente por outros usuários. Então, também se abre uma oportunidade para candidatos poderem corrigir eventuais informações mentirosas a seu respeito. O mesmo vale para a imprensa, que pode usar as redes sociais para checar informações corretas.
ÉPOCA – Quem são os políticos mais engajados?
Sharp – Nos Estados Unidos, curiosamente, os mais velhos estão à frente dos mais novos. São políticos de uma época em que você não tinha tantas opções de acesso ao eleitor, além do corpo a corpo. Precisava bater porta a porta. O Twitter é uma forma de eles voltarem ao método tradicional. Em 2008, um quarto dos congressistas americanos estava no Twitter. Em 2012, eram 100%. Houve grande adesão ao Twitter no Japão, na Coreia do Sul e na França. Analistas disseram que as redes sociais tiveram um papel decisivo nas eleições da Índia neste ano. Estive pessoalmente em Brasília, em maio, para conversar com assessores de parlamentares brasileiros. Tínhamos a expectativa de encher um salão para a palestra. Precisamos reservar mais três salões, com transmissão ao vivo por telões, para dar conta da demanda. Isso mostra o interesse que os políticos do Brasil têm pelas redes sociais.
ÉPOCA – Temos visto no Brasil exércitos de militantes virtuais convocados por partidos. Eles usam diversas táticas para desmoralizar adversários nas redes sociais. Como o senhor avalia essa estratégia? Isso é algo que só ocorre no Brasil?
Sharp – Acontece em todo o mundo. Da mesma forma que, na era pré-internet, havia um mix de publicidade positiva e negativa dos candidatos. Há, sim, gente totalmente dedicada a promover ou desestabilizar um ou outro candidato. Mas as pessoas têm amplo acesso às informações “do outro lado”. Se sentirem que são desrespeitadas, podem denunciar esses perfis.
ÉPOCA – Como é feita a fiscalização?
Sharp – Hoje, estamos com 500 bilhões de tuítes por dia. É difícil fiscalizar. Muitas táticas adotadas pelos partidos cruzam a fronteira do que é permitido por nossas regras. Eles usam robôs (perfis criados para compartilhar informações de forma artificial) ou outros tipos de ferramenta. Temos um time que desenvolve métodos para detectar esse tipo de comportamento. Mas são os eleitores e suas denúncias que detêm o poder maior neste caso.
ÉPOCA – Que mudanças veremos nas redes sociais, no tema eleições, nos próximos anos?
Sharp – Minha experiência no Twitter me diz para não fazer previsões de longo prazo. Passamos por algumas fases do engajamento político. A primeira foi o descobrimento. Políticos começando a usar e a entender redes sociais. A segunda, vivemos hoje, com os políticos começando a usar as redes sociais de forma estratégica durante a campanha, para ganhar votos. A próxima fase ainda está no início. Será a próxima grande onda. É usar as redes sociais para melhorar a confiança em serviços públicos. Voce vê experimentos em cidades com pessoas tuitando que o ônibus está atrasado. Em Nova York, podem-se acionar vários serviços públicos por meio de tuítes. Se você vê um buraco na rua, pode tuitar para a equipe de manutenção da prefeitura. Na Espanha, a polícia colocou os perfis do Twitter bordados no uniforme dos policiais. O objetivo é aproximá-los da comunidade. É como voltar à infância, quando todo mundo sabia o nome dos policiais do bairro.
(fonte:Revista Epoca) edição de André Silva