Quantidade insuficiente de funcionários, aliada à superlotação, facilita situações como fugas
“Não podemos esperar as coisas piorarem, porque as consequências podem ser terríveis tanto para os presos, quanto para os agentes penitenciários e à própria população”. Essa foi a conclusão do presidente da Comissão de Direitos Humanos, Cidadania, Ética e Decoro da Câmara Legislativa, Ricardo Vale, após visita ao Complexo Penitenciário da Papuda, na manhã de ontem. Para ele, o número reduzido de agentes agravaria os problemas. Nesta semana, um detento fugiu e cerca de 40 fizeram greve de fome.
Ontem, o JBr. mostrou que Danilo Silva Souza, 21, fugiu da Papuda dois anos e 12 dias após ser condenado por um assassinato, que tem pena de oito anos de prisão. Além deste crime, o jovem é acusado de tentativa de homicídio – ainda não julgado. Até agora ninguém sabe explicar o que, de fato, ocorreu. Naquele mesmo dia, se encerrou uma greve de fome que durou uma semana por cerca de 40 detentos.
“Familiares denunciaram o protesto e fizemos uma diligência. A direção confirmou e os presos também. A greve ocorreu em função de direitos descumpridos, como banho de sol e visitas, que estariam acontecendo em a intervalos de 15 dias, quando o direito é semanal”, revelou Ricardo Vale.
Segundo o diretor da penitenciária, Elivaldo Ferreira de Melo, os banhos de sol continuarão permitidos nos espaços abertos de cada cela individual – em pátios coletivos existiria risco de atrito entre grupos rivais. As visitas, a cada 15 dias, também não devem mudar.
“Se o Estado não colocar mais agentes penitenciários ali imediatamente, além de os presos não terem seus direitos contemplados, isso pode comprometer a segurança do presídio”, defende Vale.
O Sindicato dos Agentes de Atividades Penitenciárias do DF (Sindpen) também denuncia o déficit de profissionais. Seria necessário pelo menos o dobro dos 1.250 agentes que hoje atuam. Está em andamento o concurso público para o preenchimento imediato de 200 vagas, além do cadastro reserva de 900 agentes. Esse efetivo, diz o Sindpen, ainda não será suficiente, já que o DF tem 14 mil detentos, o dobro da capacidade.
Familiares denunciam humilhação
Se para detentos e agentes penitenciários a situação é considerada crítica, familiares que têm a intenção de realizar visitas dizem sofrer de descaso e assédio moral. Por medo de represálias ou marcações, como dizem, preferem não se identificar.
Ana (nome fictício) é desempregada, tem 28 anos e mora em Samambaia. Ontem, chegou às 7h para que conseguisse visitar hoje o esposo, que está preso há um ano e dois meses por roubo. Com ela estava Iris (nome fictício), gari de 24 anos, moradora de Santa Maria. A jovem tinha a intenção de encontrar o marido, que está na metade do período de reclusão da pena de latrocínio. Essa é a segunda vez que ele vai parar atrás das grades.
Tratamento
As duas dizem que acampar é a única forma de conseguir entrar. “Nós somos humilhadas. Nos fazem correr na chuva ou no sol pra pegar uma senha. Já jogaram spray de pimenta, soltaram cachorros em cima da gente, chutam nossas barracas dizendo que aqui não tem camping”, relata Ana.
Visita é cancelada sem motivo claro
Iris (nome fictício) ficou cinco meses sem conseguir visitar o marido. “Resolveram bloquear minhas visitas sem justificar nada. Esses dias me oprimiram dentro de uma sala por não acreditarem que eu não estava com drogas. Passei por revista nua, raios X e depois fizeram pressão psicológica. Cheguei a chorar e zombaram de mim”, lembra. “Eles nos tratam como se fôssemos bandidos”, resume.
“O que a gente mais houve de queixa de familiares em visita são as questões das revistas vexatórias ou com abuso. Se esses relatos forem reais, é algo completamente irregular e criminoso, mais ainda quando não se conhece a causa. É indigno”, avalia Beatriz Vargas, especialista em Direito Penitenciário.
“Penitência”
“A gente precisa discutir o tratamento que a direção tem dado a esses familiares. Os detentos já estão pagando a pena deles. Os pais, irmãos, filhos não são obrigados a cumprir também”, avalia o presidente da Comissão de Direitos Humanos, Ricardo Vale.
Ele acredita que é necessário melhorar esse tratamento e “verificar se isso também ocorre em função do efetivo pequeno ou se realmente é falta de direitos humanos”.