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Situação da mulher foi ‘desculpa’ para invadir Afeganistão, diz ativista

Ela muda de casa constantemente por causa das ameaças, já sofreu sete tentativas de assassinato e foi expulsa do Parlamento afegão por defender os direitos das mulheres de seu país – mas o que mais deixa a ativista Malalai Joya indignada, segundo ela, é que sua vida não é diferente da de outras milhares de afegãs. “Nas últimas quatro décadas, mulheres e crianças foram as maiores vítimas dos conflitos no Afeganistão. Hoje, 80% das mulheres do meu país sofrem violência doméstica, há ataques a meninas que vão para a escola, elas são envenenadas”, disse Malalai ao G1, após seu discurso na abertura da 9ª Marcha Mundial das Mulheres, que ocorre até o dia 31, em São Paulo.

Segundo a ativista, autora do livro “Raising My Voice” (‘Levantando a minha voz”, sem tradução em português) e eleita uma das 100 pessoas mais influentes do mundo pela revista “Time” em 2010, a degradante situação das mulheres foi uma “ótima desculpa” para os EUA e a Otan invadirem o Afeganistão. “O regime misógino do Talibã foi substituído pelo regime dos senhores da guerra. Há mulheres no governo, 68 entraram para o Parlamento, mas elas apoiam os senhores da guerra em troca de poder.”

Malalai foi eleita membro do Parlamento em 2005, mas foi expulsa e recebeu (e ainda recebe) ameaças após denunciar mortes e violações de direitos humanos. “Eles dizem que eu posso voltar se pedir desculpas, mas é claro que eu não farei isso”, disse ela. A ativista contou que neste momento acompanha o caso do assassinato de uma menina de 16 anos. “Shakila foi brutalmente estuprada e morta por um membro de um conselho provincial, e os parlamentares que têm participação no crime estão tentando forjar provas.”

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A ativista afegã Malalai Joya
(Foto: Giovana Sanchez/G1)

‘Não é primavera nem nunca foi’
Aos gritos de “Seguiremos em marcha até que todas sejamos livres”, a nona edição do evento feminista reúne pela primeira vez no Brasil lideranças de diversas partes do país e do mundo. A delegação da Tunísia veio com uma ativista a menos. Basma Khalfaoui, viúva do líder oposicionista Chokri Belaid, assassinado em fevereiro de 2013, em circunstâncias semelhantes às do recente assassinato de Mohammed Bhrami, ficou em seu país por motivos de segurança.

“Ela não pode sair de casa com os filhos. Está muito perigoso”, contou ao G1 sua amiga e companheira de militância Mahmoud Souad, de 54 anos. Mahmoud disse que a Tunísia tinha, desde meados da década de 1960, uma legislação avançada na questão de direitos femininos em relação a outros países da região – com direito a educação e saúde públicas, direito ao aborto e possibilidade de se divorciar – mas, segundo ela, o governo atual, eleito após a derrubada do ditador Zine al Abidine Ben Ali, em 2011, na rebelião que desencadeou a chamada “Primavera Árabe”, está ameaçando regredir essas conquistas.

“Eles não reconhecem nossos direitos, querem trazer tudo de volta. O que aconteceu não foi uma primavera, como dizem, nem nunca foi. Não vamos aceitar. Há mulheres já com medo, não saem mais nas ruas e colocam o véu com receio de represálias. Mas estamos lutando – e hoje os homens estão nos apoiando. Estou muito feliz em ver que estamos indo para as ruas. Só espero que nāo fiquemos como o Egito, com tanto derramamento de sangue. Mas se precisar, assim faremos. Os fundamentalistas precisam sair.”

Outro palco de recentes protestos, a Turquia veio representada pela ativista Yildiz Temürtürkan, de 45 anos. Segundo ela, as manifestações que começaram com um grupo de ecologistas pela defesa de um parque, desencadearam um debate sobre a questão das mulheres. “As mulheres jovens são um símbolo dos protestos. Estamos agora tendo fóruns abertos e workshop sobre a linguagem ofensiva às mulheres, ou seja, está havendo mais debate”, disse ela ao G1. Yildiz lembra que a luta das mulheres é antiga e longa. “Lembro que, quando eu era criança, na minha casa, as meninas só podiam comer depois que os homens levantassem da mesa, não podíamos sentar com eles.”

A abertura da Marcha teve a participação da ministra Eleonora Menicucci, da secretaria de Política para as Mulheres, e de Denise Motta Dau, da Secretaria Municipal de Políticas Para as Mulheres. A Marcha ocorre até o dia 31 de agosto no Memorial da América Latina. A programação está no site.

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A militante tunisiana Mahmoud Souad
(Foto: Giovana Sanchez/G1)

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